quinta-feira, 19 de março de 2009

Uma Lição de Maçonaria para Maçons



Escrito por Fonte: Web Site blogs.parlamento.pt
Caros Irmãos:

Eis uma grande lição de maçonaria para os Maçons, após transcorridos 200 anos.


Tocqueville e o lugar da liberdade

Alexis de Tocqueville nasceu há duzentos anos, em 29 de Julho de 1805, e merece ser recordado pelo pioneirismo das suas análises e das suas preocupações. A argúcia, o realismo, a inteligência e as circunstâncias em que viveu fizeram deste aristocrata liberal um dos melhores estudiosos da Revolução, através de uma obra fundamental, que põe em confronto o Antigo Regime e as mudanças iniciadas em França no ano de 1789, e o melhor dos analistas da Revolução americana e das suas conseqüências. Viu, assim, com notável espírito de antecipação, os perigos que se desenhavam, mas também as potencialidades em resultado das revoluções democráticas, inglesa, americana e francesa. À força do destino e do fatalismo atávicos soube contrapor as idéias de liberdade, de autonomia individual e de responsabilidade, que conduziriam à emancipação pessoal. A sociedade americana construiu-se dentro deste espírito e afirmou-se contra o colonizador, valorizando o “outro” que vinha de longe construir a nova nação. Assim se criaram os mecanismos de coesão e de confiança, indispensáveis à preservação de um regime baseado na liberdade, na igualdade e no respeito mútuo por diferentes crenças e convicções. Tocqueville (1805-1859) fez, assim, uma leitura da democracia americana contrapondo-a à necessidade da revolução, afirmando que “quem procura na liberdade outra coisa diferente dela mesma, é porque está feito para servir”… E, assim, enriqueceu o conceito de comunidade política com o entendimento pioneiro de um federalismo de dupla legitimidade, da União e dos cidadãos, apto a consolidar o entendimento moderno de cidadania universal. O “primado da lei” torna-se, desta forma, “uma espécie de amor instintivo pelo encadeamento regular das idéias que tornam (os cidadãos) naturalmente fortes opositores do espírito revolucionário e das paixões irrefletidas da democracia”.


"Julgar os fatos, mais do que contá-los", eis a vocação do jovem autor. E não haja dúvidas sobre a importância dessa atitude. Alexis de Tocqueville colocou-se na situação de quem quis verificar como as sociedades poderiam lidar com a liberdade e a dignidade da pessoa humana. Estamos perante uma mistura entre história propriamente dita e filosofia da história. Mais importante do que seguir os caprichos de um governo, importaria seguir e respeitar as leis livremente consentidas pela sociedade dos cidadãos, que a todos consideram como iguais. Tocqueville viu, assim, antes de muitos outros, como se iria configurar a sociedade em que hoje vivemos, onde a igualdade se tornou a verdadeira pedra de toque, mas também o quebra-cabeças. Pedra de toque, porque a liberdade exige a igual consideração e respeito de todos. Quebra-cabeças porque há um dilema permanente entre a liberdade e o reconhecimento das diferenças, que conduz ora à tirania do igualitarismo ora à abstração da liberdade. Liberdade positiva e liberdade negativa, eis-nos sempre perante a complementaridade necessária entre igualdade e diferença… “Aquilo que em todos os tempos ancorou a liberdade no coração de alguns homens foi o seu encanto próprio, independentemente dos seus benefícios, foi o prazer de poder falar, agir, respirar sem constrangimento, sob o único governo de Deus e das leis” – disse em “O Antigo Regime e a Revolução” (1856).


Entre Abril de 1831 e Março de 1832, o jovem Alexis partiu para a América a realizar um estudo sobre o sistema prisional nos E.U.A., para que se pudesse transpor para França algumas das soluções praticadas no novíssimo País. A Revolução de Julho de 1830, pusera no trono um rei moderno e reformista, Luís Filipe de Orleães, à frente de uma plêiade de governantes de horizontes abertos, que poderia favorecer importantes transformações sociais. Tocqueville, discípulo e admirador de um dos homens da nova situação (Guizot) acreditava sinceramente nas virtudes reformistas. E fez esta viagem com olhos de futuro, passadas que estavam a ilusão e a ambigüidade da Restauração, as contradições insanáveis do Império e a cegueira mais radical da Revolução. Curiosamente, o estudo sobre as prisões jaz nos arquivos, mas a reflexão complementar – “Da Democracia na América” (1835-40) que deu à estampa tornou-se uma obra-prima da cultura política ocidental.


E, se hoje lemos com um interesse redobrado a obra-prima, monumento de inteligência e de curiosidade, a verdade é que nele ressalta o mais difícil, mas o mais essencial dos conceitos políticos da atualidade - o de igualdade. Quantos projetos vãos? Quantas tiranias se erigiram em seu nome? E, no entanto seria pela ligação entre liberdade e igualdade que poderíamos encontrar os novos caminhos de coesão e de solidariedade cívica. E Tocqueville demarcou-se, neste como noutros temas, do pensamento conservador, encontrando-se com a tradição antiga dos reformadores da antiguidade. “As nações aristocráticas – diz – são naturalmente levadas a contrair demasiadamente os limites da perfectibilidade humana, ao passo que as nações democráticas os alargam, por vezes excessivamente. Quanto a mim, conclui, longe de criticar a insubmissão que a igualdade inspira, é precisamente por isso que a enalteço”. A insubmissão é marca de liberdade e independência. O conformismo igualitarista, aliado à mediocridade, seriam perigos que levariam à tirania à indiferença. Importaria, por isso, garantir que igualdade e liberdade se completassem. Daí a importância do associativismo livre, da liberdade de imprensa, da liberdade religiosa (e de um “cristianismo democrático e republicano”, para o qual a verdade política foi deixada por Deus “às livres indagações dos homens”), bem como da vivência comum dos valores da cidadania, contra o egoísmo e a inveja. Por isso mesmo, A. de Tocqueville profetiza que não será a igualdade a causar perturbações sociais, mas sim a desigualdade de condições, antecipando a importância dos grandes combates cívicos e políticos das sociedades contemporâneas.


Raymond Aron foi talvez o primeiro a compreender a força e a atualidade de Tocqueville, colocando-o ao lado de Montesquieu, no fino entendimento das condições e das conseqüências sociais dos regimes políticos. Ao refletir sobre a política, com o seu valor próprio, o autor lançou as bases de uma análise que pôde ultrapassar as fronteiras do tempo. Pessoas concretas e instituições interessavam-no. O fenômeno político seria o resultado de uma relação entre o que permanece e o que passa, os conflitos tornar-se-iam tão importantes como os equilíbrios, a moderação só teria sentido se coexistisse com a radicalidade, a autonomia fortalecer-se-ia com o altruísmo, a laicidade pressuporia o respeito pelo fenômeno religioso. “A religião entre os americanos nunca se encontra diretamente envolvida no governo da sociedade, deve ser considerada, no entanto, a primeira das suas instituições políticas, pois se não cria o gosto da liberdade, facilita, singularmente, o seu uso”. Infelizmente, há quem hoje não entenda esta afirmação. A atualidade da escrita de Tocqueville vem da força de uma ética e do despojamento das considerações valorativas datadas e previsíveis. E assim o pluralismo e o respeito mútuo surgem como fatores de enriquecimento humano, social e político - porque a liberdade só faz sentido quando assumida, por si mesma, por iguais e entre iguais, em dignidade e em direitos.

Publicado em sexta-feira, 29 de Julho de 2005 10:36

Fonte: Web Site blogs.parlamento.pt (Casa dos Comuns – Parlamento de Portugal)
Adm. Anatoli Oliynik
Curitiba - Paraná
"Alguns homens atravessam a floresta e não encontram lenha" (Provérbio inglês)

Se Perguntarem: QUANTOS SOIS VÓS? Respondereis: SOMOS UM SÓ.

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